A determinação da atitude de sensores por meio da tecnologia GPS

Em diversas aplicações é importante se conhecer a orientação de sensores dos mais diversos. A importância do conhecimento da orientação de sensores advém do fato de se desejar saber para onde o sensor, atrelado ao veículo que o transporta, está apontando durante o processo de coleta de dados. Como exemplo de aplicações onde a orientação é importante, pode-se mencionar levantamentos hidrográficos, aerofotogrametria e sensoriamento remoto aerotransportado, e mapeamento terrestre móvel. Tais aplicações se valem de sensores dos mais diversos, tais como ecobatímetros multi-feixe, câmaras fotogramétricas e sensores de sensoriamento remoto, câmaras de vídeo, sensores a laser, etc. Orientação, ou atitude (sendo este último termo um pouco mais usual), pode ser determinada por meio de sistemas inerciais ou GPS. Esta coluna se concentra na determinação da atitude de sensores por meio da tecnologia GPS.

O movimento de um ponto de referência atrelado ao corpo rígido de um veículo (usualmente o seu centro de massa) pode ser representado por um movimento de translação e um movimento de rotação, cada qual com 3 graus de liberdade. A posição e a velocidade do ponto de referência caracteriza o seu movimento de translação. A atitude do corpo rígido, bem como a sua taxa de variação, caracteriza o movimento de rotação.

A descrição da atitude é possível ao se estabelecerem relações entre três sistemas de coordenadas por meio de ângulos de rotação. Primeiramente, a atitude é descrita por três ângulos de rotação entre os eixos de um sistema de coordenadas fixo (SCF) ao veículo e um sistema de coordenadas local (SCL). Os dois sistemas possuem origem no centro de massa do veículo. O SCF (ver Figura 1) é um sistema de coordenadas cujos eixos são fixos ao veículo em movimento, mantendo orientação constante com respeito ao veículo: um eixo longitudinal x apontando para a frente do veículo, um eixo lateral y apontando para o lado direito do veículo, e um eixo vertical z geralmente apontando para baixo definindo um sistema de coordenadas de mão-direita. Variações de atitude em torno do eixo x definem o ângulo de rolagem, também chamado de bancagem ou de jogo (roll na literatura inglesa). Variações de atitude em torno do eixo y definem o ângulo de arfagem (pitch na literatura inglesa). Variações de atitude em torno do eixo z definem o ângulo de guinada, ou azimute (yaw na literatura inglesa). Em fotogrametria, estes ângulos são referidos por letras gregas: k, f e w. Estes ângulos são os parâmetros de atitude.


Figura 1: sistema de coordenadas fixo ao corpo de uma embarcação

O SCL, também chamado de sistema de coordenadas local plano, mantém uma orientação fixa no espaço ao mesmo tempo em que acompanha o movimento de translação do veículo. O seu eixo x aponta na direção do norte verdadeiro, o eixo y na direção leste e o eixo z aponta para o nadir. O SCL é muitíssimo similar ao sistema de coordenadas geodésico local, muito usado em Geodésia (com a diferença que neste o eixo z aponta para o zênite).

Os dois sistemas se relacionam através de matrizes de rotação cujos argumentos são os ângulos de rolagem, arfagem e azimute. O produto entre estas matrizes resulta em uma única matriz, chamada de matriz de atitude. Essa matriz é importante pois permite que os parâmetros de orientação sejam determinados ao longo da trajetória do veículo.

É usual expressar o vetor posição do veículo em um sistema de coordenadas referido ao centro de massa da Terra, como o WGS 84. Este sistema de coordenadas se relaciona com o SCL através de matrizes de rotação cujos argumentos são as coordenadas geodésicas, latitude e longitude do ponto de referência dos sensores a bordo.

Com o GPS é possível determinar os parâmetros de atitude de um veículo. Para tal, são usadas observações coletadas por pelo menos 3 receptores, ou por um sistema especial composto por um receptor conectado a pelo menos 3 antenas, instalados a bordo do veículo. Um exemplo de tal arranjo é mostrado na Figura 2. O GPS fornece as coordenadas geocêntricas das antenas. E um procedimento inicial de calibração define os vetores entre as antenas no SCF. A questão passa a ser como relacionar os dois sistemas. Em primeiro lugar, as coordenadas geocêntricas são transformadas para o SCL. Depois disso, passa-se a determinar a matriz de atitude, uma para cada época de observação, e, a partir dela, determinar-se os parâmetros de atitude.


Figura 2: Aeronave com um conjunto de 4 antenas GPS (círculos vermelhos)

Alguns aspectos de natureza prática podem ser mencionados. Inicialmente, a suposição de que estamos lidando com um corpo rígido pode não ser correta, principalmente no caso de uma aeronave. Durante o vôo as asas sofrem deformações que provocam alterações nas coordenadas previamente definidas no SCF. Estas variações devem ser levadas em consideração durante o processo de determinação da atitude. Outra suposição feita foi com respeito à origem do SCF e do SCL, que dificilmente têm como origem o centro de massa do veículo. Uma outra questão importante diz respeito ao espaçamento entre as antenas. A determinação da atitude é sensível ao nível de ruído embutido na solução fornecido pelo GPS. Este erro se propaga na determinação da atitude inversamente proporcional ao distanciamento entre as antenas. Dentro deste aspecto, quanto maior a distância entre as antenas melhor.

Existem hoje no mercado conjuntos formados por uma combinação entre receptor e antenas destinados a determinação dos parâmtreos de atitude de veículos, ou de pelo menos parte deles. Estes sistemas são geralmente compostos por um único receptor conectado a duas ou três antenas.

Marcelo Carvalho dos Santos é Ph.D. em Geodésia e Engenharia Geomática pela Universidade de New Brunswick, Canadá, onde é professor adjunto e membro do Laboratório de Pesquisa Geodésica. E-mail: msantos@unb.ca