A exploração de madeira no manejo florestal é seletiva, ou seja, removem-se de três a cinco árvores por hectare (menos de 5%) e deixam-se pequenas clareiras. Em geral, é difícil detectar essas clareiras por imagens de satélite. Entretanto, estudos do Imazon têm demonstrado que é possível detectar a exploração de madeira e avaliar a qualidade do manejo florestal por meio dessas imagens. Neste O Estado da Amazônia, apresentamos os resultados da avaliação da qualidade de planos de manejo florestal na região centro-oeste da Amazônia Legal, utilizando indicadores de “boas práticas” de manejo florestal medidos a partir de imagens Landsat. De um total de 87 planos de manejo autorizados em 2003 pelo Ibama na região centro-oeste da Amazônia e analisados neste estudo, a maioria (54%) apresentou indícios de irregularidades com base nessas imagens. Entre as irregularidades, incluem-se: ausência de sinais de exploração madeireira, exploração conduzida antes da autorização, exploração seguida de desmatamento e área explorada maior que a área declarada no plano. Sugerimos que o método seja usado no processo de licenciamento e monitoramento de áreas privadas com e sem certificação florestal e de áreas sob concessão florestal na Amazônia.

Centro-oeste da Amazônia

Analisamos 87 planos de manejo florestal, aprovados em 2003 pelo Ibama, localizados na região centro-oeste da Amazônia Legal, que abrange o oeste do Estado do Pará e o sudeste do Amazonas (Figura 1). Essa região tem sido alvo da abertura de milhares de quilômetros de estradas ilegais e de novas frentes de desmatamento. Além disso, o esgotamento de madeira em pólos madeireiros antigos tem forçado a migração da indústria madeireira para a região. Em resposta a essa pressão, o governo federal e o governo do Estado do Amazonas criaram um amplo mosaico de Unidades de Conservação para evitar que a fronteira do desmatamento avance no centro-oeste da Amazônia.

Figura 1. Planos de manejo florestal autorizados em 2003 no centro-oeste da Amazônia Legal.
Figura 1. Planos de manejo florestal autorizados em 2003 no centro-oeste da Amazônia Legal.

Planos de manejo florestal nas imagens de satélite

O monitoramento de planos de manejo florestal na Amazônia requer tempo e custo elevado para verificação no campo. Entretanto, estudos do Imazon sobre monitoramento da exploração madeireira com imagens de satélite demonstram que é possível avaliar a qualidade dos planos de manejo por meio dessas imagens. Além disso, é possível avaliar se os planos de manejo foram ou não executados, se a exploração ocorreu antes da autorização e se a área do plano de manejo foi desmatada após a exploração.

Situação dos planos de manejo florestal

Dos 87 planos de manejo avaliados, 43 (49%) apresentaram cicatrizes de exploração madeireira visíveis nas imagens, dos quais 10% foram explorados antes da autorização e 3% foram desmatados depois da exploração.O restante (51%) não apresentou cicatrizes visíveis nas imagens (Figura 2).

Figura 2. Situação dos planos de manejo florestal nas imagens de satélite.
Figura 2. Situação dos planos de manejo florestal nas imagens de satélite.

Dentre os planos visíveis na imagem, a quase totalidade (93%), segundo dados do Ibama, estava apta ou apta com restrições para exploração madeireira (Tabela 1). Os planos não aptos ou suspensos somaram 7% dos planos executados. A execução de plano não autorizado para exploração caracteriza uma infração e serve de alerta para inspeção no campo.

Tabela 1.
Situação jurídica dos planos de manejo florestal não isíveis e visíveis nas imagens de satélite.

Tabela 1. Situação jurídica dos planos de manejo florestal não visíveis e visíveis nas imagens de satélite.

Por outro lado, dos 44 planos de manejo não-visíveis nas imagens, a grande maioria (80%) estava apta ou apta com restrições para explorar. Os planos restantes, não detectados nas imagens (20%), não estavam aptos, estavam cancelados ou estavam suspensos (Tabela 1). A ausência das cicatrizes de exploração do plano de manejo na imagem pode ser considerada um alerta, exigindo verificação da situação do plano no campo. Esse tipo de problema pode estar associado a três fatores: I. erros de localização geográfica do plano de manejo; II. não execução do plano de manejo no campo na área autorizada; e III. exploração madeireira em outras áreas não autorizadas.

Ao considerar todos os problemas nos planos de manejo (planos aptos sem sinal de exploração, exploração antes da autorização e desmatamento após a exploração), concluímos que 54% dos planos de manejo deste estudo apresentaram algum tipo de irregularidade (Figura 2).

Qualidade dos planos de manejo florestal

Comparamos os 43 planos de manejo detectados nas imagens de satélite com quatro planos de manejo examinados no campo nas regiões de Paragominas, no Pará, e Sinop, em Mato Grosso – onde foram conduzidos os testes e a validação (Tabela 2). Os planos de manejo foram avaliados por indicadores que podem ser medidos nas imagens de satélite e analisados quanto à qualidade do manejo florestal.

Tabela 2. Comparação entre os indicadores (média) medidos nas imagens no centrooeste da Amazônia e os medidos no campo em Paragominas e Sinop.
Tabela 2. Comparação entre os indicadores (média) medidos nas imagens no centrooeste

Os planos de manejo analisados apresentam indicadores (densidades de pátios e estradas, distâncias entre estradas secundárias e entre pátios) similares aos obtidos para a exploração predatória em Sinop (Tabela 2). Portanto, podemos inferir que os planos de manejo analisados podem ter sido conduzidos com baixo planejamento na construção de pátios e estradas. Vistorias de campo poderiam ser feitas para a verificação desses indícios.

A forma da área explorada e a distribuição espacial de pátios e estradas foram classificadas como sistemática e não-sistemática (Figura 3). A maioria (79%) dos planos de manejo apresentou forma da área explorada sistemática, enquanto pátios (60%) e estradas(58%) apresentaram distribuição não-sistemática (Figura 4). De acordo com a especificação técnica de instalação de infra-estrutura, estabelecida e aprovada no plano de manejo, a distribuição não-sistemática de pátios e estradas pode indicar baixa qualidade do planejamento da infra-estrutura para estocagem e transporte de madeira. A infração dessa regra prevê uma ação corretiva que deve ser cumprida até a próxima safra.

Figura 3. Exemplos de planos de manejo florestal vistos nas imagens Landsat, indicando a forma da área explorada – sistemática (A) e não-sistemática (B)– e a distribuição espacial de pátios e estradas –sistemática (A) e não-sistemática (B).
Figura 3. Exemplos de planos de manejo florestal vistos nas imagens Landsat, indicando a forma da área explorada – sistemática (A) e não-sistemática (B)– e a distribuição espacial de pátios e estradas –sistemática (A) e não-sistemática (B).

Figura 4. Avaliação da forma da área explorada e da distribuição espacial de pátios e estradas nos planos de manejo florestal obtidas a partir de imagens de satélite.
Figura 4. Avaliação da forma da área explorada e da distribuição espacial de pátios e estradas nos planos de manejo florestal obtidas a partir de imagens de satélite.

Avaliamos também a relação da área autorizada para exploração no plano de manejo com a área explorada detectada pela imagem de satélite. Observamos que apenas 6% dos planos de manejo mostraram que a área explorada foi aproximadamente igual à área autorizada; 32% apresentaram área explorada maior que a área autorizada; e 11% mostraram área explorada menor que a área autorizada. O restante (51% dos planos) não apresentou sinais de exploração visíveis nas imagens. Quando somamos os planos de manejo com a área explorada maior que a área autorizada e área explorada não-visível na imagem (planos aptos), 72% dos planos apresentaram indicação de problemas em relação à área explorada.

As informações sobre a situação e qualidade dos planos podem ser combinadas para uma avaliação geral. As nossas análises revelaram que a maioria dos planos (82%) apresentou algum tipo de alerta que merece verificação no campo.

Sugestões para políticas públicas

Os resultados deste estudo mostraram que é possível monitorar planos de manejo florestal na Amazônia por meio de imagens de satélite. Dessa forma, sugerimos duas implicações do método para políticas públicas:

Licenciamento. Garantir que as áreas licenciadas sejam florestas primárias, com potencial de produção e situação fundiária regular. Portanto, por meio da sobreposição do polígono do plano de manejo em imagens NDFI8 e Áreas Protegidas seria possível prevenir a aprovação de planos em áreas irregulares ou impróprias (áreas desmatadas, Terras Indígenas, Unidades de Conservação de Proteção Integral, Áreas de Preservação Permanente, entre outras). A inclusão de critérios relacionados a: I. densidade de pátios e estradas; II. distância entre estradas e entre pátios; e III. data (dia/mês/ano) das operações de derruba e arraste – nos regulamentos para aprovação dos planos de manejo– poderia contribuir para aumentar a transparência do setor florestal na Amazônia.

Monitoramento. Identificar irregularidades na execução dos planos de manejo. Dessa forma, seria possível verificar: se o plano foi executado, se a exploração ocorreu antes da autorização, se a área do plano foi desmatada após a exploração, se a área explorada foi autorizada para exploração e se o plano apresenta indícios de pouco planejamento de pátios e estradas. Portanto, seria possível selecionar planos de manejo para a vistoria técnica anual no campo pelo órgão ambiental competente, priorizando-se as áreas mais críticas do plano. Além disso, o método poderia ser usado para monitorar Florestas Públicas sob regime de concessão florestal e áreas certificadas na Amazônia. Neste último caso, o método seria usado para determinar as áreas a serem vistoriadas no campo, dentro do processo de certificação florestal, bem como para monitorá-las anualmente, dentro do processo de auditoria.

André Monteiro & Carlos Souza Jr.
Retirado de O Estado da Amazônia