Tenho percebido a proliferação de termos associados a uma das técnicas mais refinadas nas geociências: a análise espacial. São variados os segmentos e tipos: minning espacial, inferência espaço-temporal, GWR, etc..

Em termos gerais e simplórios, a análise espacial é a apresentação espacial de variáveis como população, consumo, etc.. Por que digo simplório? Porque o emprego de tal técnica abarca os próprios métodos de visualização, mais os métodos de investigação dos padrões dos dados e métodos que auxiliam a escolha do modelo estatístico e de estimação de parâmetros (Inpe, 2005).

Observo, por me valer de tais técnicas há 10 anos (demanda, vendas e planejamento), que os trabalhos intuitivos, empregando metodologia estatística simples por vezes inconsistente e acabam por ser um emprego direto de ferramentas especializadas sobre um conjunto de dados. Uma verdadeira oportunidade para aventureiros e/ou profissionais mal capacitados.

Mas por que isso? Vários são os motivos. Para não divagar vou ater-me a dois pontos: concorrência e formação profissional.

No que tange à concorrência, distinguem-se dois tipos: entre as empresas e entre as pessoas. O primeiro, relacionado aos negócios e o segundo à concorrência no emprego.

Existe uma necessidade latente de se ter diferencial competitivo frente à concorrência e, neste caso, re-empacotar produtos e serviços é uma técnica consolidada. Basta consultar os livros de Kotler, o pai do marketing. Caracteriza uma prática comum, mas demanda limites pelo risco da perda de credibilidade.

No campo profissional, uma vez que o geoprocessamento caminha para a transdisciplinaridade, mais e mais usuários vão encontrar uso para tais técnicas. Neste ponto, duas questões são centrais: ética e capacitação.

Quando se empregam técnicas consolidadas há décadas, como as de análise espacial (exemplos na Tabela 1), de forma direta na confecção de teses, artigos e afins, não é ético afirmar que isto caracteriza descoberta ou novidade; sequer, cunhar neologismos a partir destes.

Tabela Análise Espacial
Tabela 1 – Exemplos de técnicas de análise espacial

Descobrir um novo uso não caracteriza invenção. Pode até caracterizar pesquisa aplicada, pois se passa a empregar a ferramenta em um novo campo do conhecimento, mas não se trata de desenvolvimento tecnológico.

Por outro lado, a capacitação é item básico e sua comprovação, e realização, devem ser exigência e prática por parte dos contratantes.

Para ilustrar, comentarei três exemplos obtidos em uma análise espacial de demanda de energia: análise de ruído branco, regime espacial e o toolbox da ferramenta.

Acredito que a maioria saiba o que é um ruído branco. O ruído branco, ou sinal branco, não é um neologismo, mas uma função estatística que descreve determinadas propriedades de um sinal, e emprega-se na avaliação do comportamento de ondas.

Estatisticamente, existe uma diferença entre não correlação e independência, o que nos leva intuitivamente à noção de ruído branco, que consiste num ruído onde todas as variáveis aleatórias seguem a mesma lei de probabilidade.

No reconhecimento de padrões, esta técnica é empregada desde os anos 70 para processar sinais e analisar séries temporais, sendo de fundamental importância na caracterização destas últimas para sua projeção. Nas figuras a seguir, são apresentadas três seqüências de ruído branco: em (a) com amplitude discreta, em (b) distribuído segundo uma lei uniforme, e em (c) segundo uma lei gaussiana.

Figuras - Análise Espacial

Pergunto: quem já empregou tal técnica na caracterização de séries temporais em suas análises de marketing? Ou ainda, tal emprego caracteriza-se como uma "descoberta"?

De certo, são poucos os que empregam, e mesmo assim não se caracteriza uma descoberta que possa propiciar a oportunidade de cunhar um novo termo na área de conhecimento das análises espaciais.

Outro ponto fundamental é diferenciar avaliação espacial e avaliação estatística. Por mais que as técnicas de análise espacial empreguem largamente modelos estatísticos (bayes, nearest neighbor, Z render), não se deve misturar projeção com determinação de regime espacial.

Avaliar a correlação local ou global de uma variável é o oposto a determinar o seu comportamento ao longo do tempo; bem como diferem de avaliar temporalmente os agrupamentos espaciais.

O primeiro avalia a independência das variáveis e em qual granulometria isto se dá. O comportamento da variável ao longo do tempo trata da escolha do modelo mais ajustado para sua projeção (linear/não-linear).

Avaliar temporalmente os agrupamentos espaciais afere o comportamento temporal de um aglomerado espacial, ou seja, se a melhor curva de ajuste para um aglomerado espacial, independentemente da granulometria, apresentará ruído branco ao longo do tempo, garantindo que estes agrupamentos sejam estáticos e desta forma projetáveis com confiança.

Isto vai de encontro às técnicas que geram índices de projeção com base em regressões melhor ajustadas aos agrupamentos espaciais locais estabelecidos; pois tais projeções são o ajustamento de séries históricas onde não se tem a garantia da independência dos dados ao longo do tempo, ou seja, é uma projeção baseada na explicação da variável por ela mesma.

Por fim, cito o emprego do toolbox da análise espacial para determinação de correlação espacial logal. Cabe ressaltar que a correlação espacial local já é ponderada. Uma pesquisa bibliográfica permite verificar que esta análise pondera os dados pela distância. Sendo assim, ela é uma análise geographically weighted por natureza.

Neste emprego, necessitei de ajuda para entender como parametrizar a análise, pois não sabia em que unidade estava caracterizada a opção de distância do centróide entre objetos. Meu projeto era em quilômetros e a ferramenta empregava a mesma unidade da base de dados: graus.

A determinação da distância, neste tipo de análise, é fundamental à ponderação. Pois bem, apesar de parecer um problema simples, a solução veio por tentativa e erro, pois o help da ferramenta não explicava, os livros publicados pela desenvolvedora da ferramenta não explicavam e os técnicos especializados da representante no Brasil também desconheciam este detalhe.

Como já ressaltado em outras publicações, minha opinião é de que o emprego da geotecnologia deve auferir ganhos de qualidade e produtividade, com o uso da mesma podendo ser avaliado através dos ciclos empresariais e que preferenciamente seu uso atenda a processos de tomada de decisão.

Posso afirmar, por experiência, que o mercado cria limites e que não será diferente com este segmento. A continuidade de comportamenteos comentados no início deste artigo, seja empresarialmente, seja por decisão pessoal para satisfação de egos, o que demonstra certa imaturidade do segmento, pode levar ao descrédito e à descontinuidade.

O aprofundamento nas técnicas estatísticas é fundamental para o estabeleciemnto de métodos e processos consistentes de análise de dados. Por si só, permite ao especialista extrair padrões em bancos de dados e compor análises temporais mais aderentes ao negócio do cliente.

Na mesma linha, reitero o alerta publicado em "Geomarketing – Como construir uma análise perene no tempo", sobre a questão da manutenção das bases, e adiciono a questão da capacitação sobre técnicas de análises espaciais.

Os treinamentos oferecidos pelas distribuidoras e representantes de software tratam do uso da ferramenta. É necessário complementar esta formação com as técnicas de análises espaciais, pois desta forma o especialista poderá discernir sobre o que tem de ser feito na análise.

Neste ponto, questiono os neologistas de plantão. Aos que bebem na fonte, o conhecimento, e a experiência de uso, da tríade estatística, GIS e análise espacial, é basilar para avaliar e criticar "novas técnicas". E para os que dão de beber, que o façam com critério técnico refinado, pois desta forma a legião de seguidores aprende e melhora o nível técnico.

Jorge Henrique de Castro
Especialista em engenharia econômica e administração industrial – Politécnica UFRJ
MBA em gestão empresarial – Politécnica UFRJ
Mestre em engenharia da computação ênfase em geomática – PGESC/UERJ
Doutorando em engenharia elétrica ênfase em computação inteligente – IEE/COPPE/UFRJ
jorgecastro@petrobras.com.br